Artigo: Correndo atrás

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Por: Rodrigo Segantini*

O ministro da saúde Marcelo Queiroga fez um pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV no domingo à noite, em horário nobre. Disse o doutor que o Brasil está ameaçado pela volta da poliomielite por conta da baixa cobertura vacinal da população. Ele lembrou que essa doença foi erradicada do país há quase 35 anos, graças a campanhas maciças e massivas em favor da imunização coletiva de crianças (quem aqui não se lembra do Zé Gotinha?), mas que nos últimos anos houve uma queda enorme da população vacinada, o que pode comprometer essa conquista. Por isso, o ministro praticamente implorou aos pais com filhos de até 15 anos para levarem-nos aos postinhos de saúde para atualizarem seus esquemas vacinais, em especial contra a pólio.

Em 2015, mais de 90% da população menor de cinco anos estavam totalmente vacinados contra a poliomielite. O ideal para se garantir que a doença não se dissemine entre nossa gente é alcançar o índice de 95%, mas convenhamos que chegamos a um patamar respeitável e que nos dá alguma segurança. Porém, graças a um trabalho persistente em desfavor da vacina contra a covid e contra todas as vacinas em modo geral a partir de 2019, ano em que Jair Bolsonaro iniciou seu governo, a cobertura vacinal caiu para cerca de 80%; em 2020, foi para pouco mais de 70%; em 2021, mal superou 60%; agora em 2022, estamos em ridículos 32,5%.

Esses dados não são meus: são dados oficiais, divulgados pelo Governo Federal. O próprio Ministério da Saúde diz que o alcance da cobertura vacinal despencou vertiginosamente durante a gestão de Jair Bolsonaro, o que, no caso da poliomielite, que chegou a alcançar quase toda a população, se reduzir a um terço do público-alvo. Por causa disso, agora os técnicos em saúde pública do próprio Governo Federal estão desesperados com a possibilidade do retorno da poliomielite ao Brasil, havendo chances reais de isso acontecer em curto prazo. Por isso, o ministro do sujeito que criticou vacinas agora implora para a população ignorar as bravatas de seu chefe e voltar a se vacinar como sempre fez.

O desmonte institucional que Jair Bolsonaro proporcionou ao país não se restringe à área da saúde. Na área do meio ambiente, ele deu conta de, nas palavras de seu ministro da área, abrir a porteira e liberar a boiada, apoiando iniciativas de exploração vegetal e mineral em áreas de preservação; na área de segurança pública, ele deu conta de liberar o controle de armas, o que dificultou o rastreamento no fornecimento deste tipo de material e facilitando o acesso das pessoas a isso, o que aumentou o número de incidentes e acidentes; na área da educação, nem é preciso dizer o que houve, bastando lembrar que passaram cinco ministros pela pasta, um deles colombiano, o outro aparentemente com um currículo falso e o último supostamente ligado a um esquema que envolviam pastores e a troca de verbas públicas por barras de ouro. Mas foi na área da saúde em que Bolsonaro se empenhou ainda mais para destruir o país, sobretudo contando com um imprevisto que foi agravado por conta desta reticência do presidente: a pandemia de covid-19.

Verdade seja dita: Bolsonaro nunca falou nada contra a vacinação de poliomielite, nem de qualquer outra doença que não fosse covid-19. Mas isso não é necessário. O presidente criticou as vacinas e disse que a melhor forma de se imunizar seria ser infectado – a despeito de que, para essa ideia ser válida, o doente precisaria primeiramente sobreviver à enfermidade e, apesar disso, poderia depois sofrer com suas sequelas. Ainda que diga que as vacinas contra a covid-19 foram providenciadas por ele próprio (como se não tivesse feito mais do que sua obrigação), não custa lembrar que Bolsonaro só tomou tal iniciativa depois que o governador João Dória correu junto com o Instituto Butatan e que foi Dória quem aplicou a primeira dose de vacina contra a covid-19 no país, quando o presidente ainda dizia que isso seria bobagem.

No ocaso do desastre que foi o governo Bolsonaro para o país em termos institucionais, o ministro da saúde vem a público tentar polir a fuligem que cobre seu currículo após aceitar figurar nos quadros de uma gestão que ficará marcada por quase destruir o Programa Nacional de Imunização. Ele não merece essa consideração, mas para o bem do nosso povo, por favor, atendamos seu chamado: vacinemos nossos filhos, levemos os jovens menores de 15 anos para atualizarem suas carteiras de vacinação.

*Rodrigo Segantini é advogado, professor universitário, mestre em psicologia pela Famerp.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

 

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